SOBRE FACÕES E MEMÓRIA

Na época em que meu pai era solteiro em Altos a maioria das brigas era regida a facão, e o
Primeiro golpe era sempre no candeeiro que iluminava o salão de festa. No escuro a coisa
descambava para a barbárie, briga no estilo Lobo Larsen, eu sei que uma dessas brigas aconteceu em uma dança de São Gonçalo e ai não prestou, uma pessoa que vei pra dança, tinha amarrado seu jumento em uma estaca da cerca de arame perto do arco de São Gonçalo, durante o corre-corre da briga, sabe-se la Deus como foi que aquele jumento se soltou e entrou porta adentro e ninguém deu fé. Quando a briga acabou e voltaram a acender o candeeiro, descobriu-se que o santo tinha sido decapitado! Tinham esculpido a imagem do santo em um pedaço de mandioca! Depois paçaram uma mão de tinta e tamos desconversado! O jumento solto acabou sentindo o cheiro da mandioca e se passou pro santo, quando tentaram salva-lo a cabeça já tinha ido.
   
Briga de facão assim como muitas outras coisas eram culturais, era muito difícil resultar em morte, mas os ferimentos eram os mais diversos. Em uma dessas um homem levou um corte na boca a baixo do nariz e quem foi que disse que ele foi embora? Continuou brigando e bebendo cachaça além do próprio sangue que escorria do local do ferimento pra boca. O outro levou um corte na altura dos rins e também não quis ir embora da festa continuou bebendo e jogando cachaça no ferimento para não infeccionar, cada copo de cachaça era dividido: metade ele bebia, metade derramava no buraco aberto a facão. Nessas brigas as vezes nem era preciso cortar o outro, bastava da uns panos de facão nas costas do outro.

Os homens da época tinham de ser um pouco exibicionistas, parece que sempre tinham de andar com um facão na cintura, cansei de ver meu pai fazer isso, principalmente quando ia sair de bicicleta e colocava a camisa pano passado com o facão por baixo, isso causava um efeito visual intimidador, porque quando ele virava as costas a gente via o cabo do facão espetando a camisa por dentro, era um jeito de dizer que andava armado. Eu ainda lembro até da marca dos facões do papai: colim e FM; Esse colim parecia ser o mais perigoso, era bom de corte, o papai vivia polindo ele, quando terminava, a lamina parecia um espelho de tanto brilho. E assim era normal ter um facão, uma espingarda em casa.  

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